quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

Que bem dito

Normalmente não estou de acordo com o que escreve o Eduardo Prado Coelho, mas neste texto dele estou a quase 100%.
De facto deveríamos meditar, tentar reagir, e conseguir passar pelo menos aos filhos e a outros que estejam ao nosso alcance esta importante mensagem.



Construir um país

Precisa-se de matéria-prima para construir um País

Eduardo Prado Coelho - in Público


A crença geral anterior era de que Santana Lopes não servia, bem como Cavaco, Durão e Guterres. Agora dizemos que Sócrates não serve. E o que vier depois de Sócrates também não servirá para nada. Por isso começo a suspeitar que o problema não está no trapalhão que foi Santana Lopes ou na farsa que é o Sócrates. O problema está em nós. Nós como povo. Nós como matéria-prima de um país. Porque pertenço a um país onde a ESPERTEZA é a moeda sempre valorizada, tanto ou mais do que o euro. Um país onde ficar rico da noite para o dia é uma virtude mais apreciada do que formar uma família baseada em valores e respeito aos demais. Pertenço a um país onde, lamentavelmente, os jornais jamais poderão ser vendidos como em outros países, isto é, pondo umas caixas nos passeios onde se paga por um só jornal E SE TIRA UM SÓ JORNAL, DEIXANDO-SE OS DEMAIS ONDE ESTÃO. Pertenço ao país onde as EMPRESAS PRIVADAS são fornecedoras particulares dos seus empregados pouco honestos, que levam para casa, como se fosse correcto, folhas de papel, lápis, canetas, clips e tudo o que possa ser útil para os trabalhos de escola dos filhos... e para eles mesmos. Pertenço a um país onde as pessoas se sentem espertas porque conseguiram comprar um descodificador falso da TV Cabo, onde se frauda a declaração de IRS para não pagar ou pagar menos impostos. Pertenço a um país onde a falta de pontualidade é um hábito. Onde os directores das empresas não valorizam o capital humano. Onde há pouco interesse pela ecologia, onde as pessoas atiram lixo nas ruas e depois reclamam do governo por não limpar os esgotos. Onde pessoas se queixam que a luz e a água são serviços caros. Onde não existe a cultura pela leitura (onde os nossos jovens dizem que é "muito chato ter que ler") e não há consciência nem memória política, histórica nem económica. Onde nossos políticos trabalham dois dias por semana para aprovar projectos e leis que só servem para caçar os pobres, arreliar a classe média e beneficiar a alguns. Pertenço a um país onde as cartas de condução e as declarações médicas podem ser "compradas", sem se fazer qualquer exame. Um país onde uma pessoa de idade avançada, ou uma mulher com uma criança nos braços, ou um inválido, fica em pé no autocarro, enquanto a pessoa que está sentada finge que dorme para não dar-lhe o lugar. Um país no qual a prioridade de passagem é para o carro e não para o peão. Um país onde fazemos muitas coisas erradas, mas estamos sempre a criticar os nossos governantes. Quanto mais analiso os defeitos de Santana Lopes e de Sócrates, melhor me sinto como pessoa, apesar de que ainda ontem corrompi um guarda de trânsito para não ser multado. Quanto mais digo o quanto o Cavaco é culpado, melhor sou eu como português, apesar de que ainda hoje pela manhã explorei um cliente que confiava em mim, o que me ajudou a pagar algumas dívidas. Não. Não. Não. Já basta. Como "matéria-prima" de um país, temos muitas coisas boas, mas falta muito para sermos os homens e as mulheres que nosso país precisa. Esses defeitos, essa "CHICO-ESPERTERTICE PORTUGUESA" congénita, essa desonestidade em pequena escala, que depois cresce e evolui até converter-se em casos escandalosos na política, essa falta de qualidade humana, mais do que Santana, Guterres, Cavaco ou Sócrates, é que é real e honestamente ruim, porque todos eles são portugueses como nós, ELEITOS POR NÓS. Nascidos aqui, não em outra parte... Fico triste. Porque, ainda que Sócrates fosse embora hoje mesmo, o próximo que o suceder terá que continuar trabalhando com a mesma matéria-prima defeituosa que, como povo, somos nós mesmos. E não poderá fazer nada... Não tenho nenhuma garantia de que alguém possa fazer melhor, mas enquanto alguém não sinalizar um caminho destinado a erradicar primeiro os vícios que temos como povo, ninguém servirá. Nem serviu Santana, nem serviu Guterres, não serviu Cavaco, e nem serve Sócrates, nem servirá o que vier. Qual é a alternativa? Precisamos de mais um ditador, para que nos faça cumprir a lei com a força e por meio do terror? Aqui faz falta outra coisa. E enquanto essa "outra coisa" não comece a surgir de baixo para cima, ou de cima para baixo, ou do centro para os lados, ou como queiram, seguiremos igualmente condenados, igualmente estancados....igualmente abusados! É muito bom ser português. Mas quando essa portugalidade autóctone começa a ser um empecilho às nossas possibilidades de desenvolvimento como Nação, então tudo muda... Não esperemos acender uma vela a todos os santos, a ver se nos mandam um Messias. Nós temos que mudar. Um novo governante com os mesmos portugueses nada poderá fazer. Está muito claro... Somos nós que temos que mudar. Sim, creio que isto encaixa muito bem em tudo o que anda a nos acontecer: desculpamos a mediocridade de programas de televisão nefastos e francamente tolerantes com o fracasso. É a indústria da desculpa e da estupidez. Agora, depois desta mensagem, francamente decidi procurar o responsável, não para castigá-lo, senão para exigir-lhe (sim, exigir-lhe) que melhore seu comportamento e que não se faça de mouco, de desentendido. Sim, decidi procurar o responsável e ESTOU SEGURO QUE O ENCONTRAREI QUANDO ME OLHAR NO ESPELHO. AÍ ESTÁ. NÃO PRECISO PROCURÁ-LO EM OUTRO LADO. E você, o que pensa?.... MEDITE!

Não tenho dúvidas

5 comentários:

Anónimo disse...

Quem foi o primeiro? O ovo ou a galinha?
Não será porque os nossos governantes foram o que foram que nos tornamos no que somos?
Não deixo de concordar com o que é dito, no entanto o contexto ou as estructuras condicionam o que fazemos, e porque o fazemos.
Não votei Socrates, mas dou-lhe os parabens pelo esforço que ele tem tido para mudar o contexto.

Esta manha via um cartaz que dizia "a saude não é um negocio, é um direito". Aqui vai um belo exemplo... Tenho eu que pagar porque outros fumam, bebem e tem habitos pouco saudaveis e depois ainda mandam vir... Aqui temos a nossa mentalidade.

FrancoAlgarvio

W. V. D. disse...

O facto dos governos não terem as melhores politicas não pode justificar o fraco desempenho das pessoas enquanto cidadãos.
Claro que se pode sempre perguntar quem foi o primeiro, mas essa é uma fraca desculpa para não tentarmos mudar

Anónimo disse...

Quem está inocente que atire a primeira pedra! Se todos fizéssemos um pouco mais e lutássemos um pouco mais, talvez vivessemos num país melhor...

Garf disse...

Apesar de o texto não ser novo - e ainda que eu ache que há sinais de que as coisas estão lentamente a mudar - creio que continua muito actual e que muito ainda terá que ser feito até deixarmos estes sinais de terceiro mundismo.

Vem isto a propósito do filho de p*** de um fiscal de Serviços Municipalizados que, alegadamente para confirmar uma ruptura de uma canalização de água que me provocou 2 facturas de água monstruosas até se ter dado com a dita, me apresentou, de chofre, esta brilhante solução: "Por mil euritos (sic), dou o contador como avariado, retiro-lhe uns bons metros cúbicos de leitura, você repara a ruptura, e ficamos todos a ganhar."

Ficamos todos a ganhar - digo eu - menos o patrão dele, que lhe paga todos os meses o ordenado. Patrão esse que, neste caso, também sou um pouco eu, já que estamos a falar de uma empresa municipal que vive também à custa dos impostos que pagamos.

Mas acredito - eu, que até já nem sou um homem de fé - que as coisas vão melhorar: assim haja coragem de quem nos governa para continuar a mexer com "poderes" instalados que há muitos, muitos anos, controlam os nossos governantes em proveito próprio...

W. V. D. disse...

Somos nós ou o País ??
Lá está...
O ovo ou a galinha ??